quinta-feira, 25 de junho de 2009

Você tem tempo para tudo?

Hora-atividade é para melhorar a formação

Hora-atividade é para melhorar a formação

A lei do piso salarial amplia o horário de trabalho extraclasse dos atuais 20% a 25% da jornada, determinados pelo Plano Nacional da Educação, de 2001, para um terço do período. Conheça estratégias que fazem desse tempo o principal momento de formação continuada do Magistério
Gustavo Heidrich (gustavo.oliveira@abril.com.br)

Professora há 27 anos, Deise Souza ainda se lembra dos tempos de faculdade. "Era uma época em que eu recebia muita informação, mas formação mesmo era pouca. Hoje, se não pensarmos no dia-a-dia da sala de aula, ficamos na mesma”, diz. Essa consciência veio quando Deise passou a usar bem o trabalho coletivo – dentro da escola e no horário de serviço – ao lado da coordenação pedagógica e de outros colegas. De lá para cá, ela passou a tematizar sua prática e, com isso, conseguiu transformar suas aulas para melhor.


PLANO DE FORMAÇÃO

A etapa inicial da criação de um plano de formação é o diagnóstico da realidade da escola. O coordenador pedagógico é o responsável por esse processo. Ele deve apresentar os desafios que a escola e os alunos enfrentam e traçar prioridades. Mas as decisões devem ser compartilhadas. É importante ouvir os professores e estimulá-los a participar da definição de objetivos.

Acompanhe abaixo o relato da coordenadora pedagógica Roseli Moreira, sobre o processo de criação do plano de formação na EMEF Nilo Peçanha, em São Paulo.

"Quando cheguei à escola, em 2005, a taxa de analfabetismo de 4ª a 8ª série oscilava entre 22% e 55%, dependendo da turma. Apresentei esse dado aos professores, e também os resultados da Prova Brasil, e a surpresa foi geral. Eles não conheciam a realidade da própria escola. Então, passei a questioná-los: O que podemos fazer para reverter esse quadro? Que contribuição vocês esperam da coordenação? Foram surgindo propostas para o que deveria ser trabalhado no horário extraclasse e a definição de metas como a erradicação do analfabetismo e a melhora da capacidade leitora dos alunos. Esses objetivos se concretizaram por meio de um grande projeto chamado 'Alfabetizar: desafio possível', em que dedicamos mais atenção aos alunos com dificuldades de aprendizagem, à criação de projetos didáticos de leitura e escrita e, por fim, ao trabalho extraclasse dedicado ao estudo das atividades de alfabetização. É tudo uma questão de gerar as demandas por meio do diagnóstico da realidade, de criar rotinas para os professores e de mostrar como e onde eles podem interferir no processo de ensino e aprendizagem. Em três anos, já conseguimos erradicar o analfabetismo na 4ª série”.
Formar os professores é a principal função do coordenador pedagógico. Veja as melhores estratégias para cumprir essa missão
Gustavo Heidrich (gestao@atleitor.com.br)


Dentro da escola, a função de coordenador pedagógico nem sempre é bem delimitada. Muitos acham que o profissional que exerce o cargo é um auxiliar do diretor para as questões burocráticas. Outros acreditam que cabe a ele resolver os problemas disciplinares dos alunos. E o pedagógico que está na denominação do cargo quase sempre é esquecido. Porém é essa palavra que define a tarefa do coordenador: fazer com que os professores se aprimorem na prática de sala de aula para que os alunos aprendam sempre. Para isso, ele só tem um caminho: realizar a formação continuada dos docentes da escola.

A confusão sobre as tarefas do coordenador – em muitas redes também chamado de orientador ou supervisor pedagógico – está relacionada a concepções diferentes sobre a maneira como ele se torna um bom profissional. Há quem acredite que ensinar é uma vocação e, por isso, o “dom” nasceria com a pessoa. Outros afirmam que ele aprende por tentativa e erro, acumulando experiências de sala de aula. E ainda existem os que defendem que o domínio do “como ensinar” vem da mera reprodução de roteiros prontos de aulas e de atividades. A necessidade de haver formação continuada só surge quando o professor é visto como um profissional que deve sempre aperfeiçoar sua prática ao fazer um trabalho de reflexão sobre ela e tem contato com o conhecimento didático. É aí que surge o papel de formador do coordenador pedagógico, que se torna imprescindível para orientar esse processo.

Para bem cumprir a função, ele deve estar sempre atualizado (o que significa estudar muito) com as didáticas específicas – compostas dos saberes sobre os conteúdos, da forma de ensinar cada um deles e da maneira como as crianças aprendem. As pesquisas sobre elas costumam ser divulgadas em seminários, livros, internet e em diversas reportagens publicadas pela revista NOVA ESCOLA. É com esse conhecimento que o coordenador pedagógico planeja os encontros de formação. Nele, ele tem dois principais caminhos a percorrer: o da dupla conceitualização e o da tematização da prática. Ambos você conhecerá em detalhes nesta reportagem.

Dupla conceitualização

É a estratégia que permite dois aprendizados simultâneos: sobre o objeto de ensino e sobre as condições didáticas para ensiná-lo.

Essa estratégia surgiu dentro da didática da Matemática e os programas de formação mais atualizados estão fundamentalmente apoiados nesse tipo de intervenção. Ela recebe esse nome por permitir que, durante a formação, ocorram paralelamente dois aprendizados: sobre o objeto de ensino e sobre as condições didáticas necessárias para que os alunos se apropriem dos conteúdos, conforme explica a educadora argentina Delia Lerner no livro Ler e Escrever na Escola: o Real, o Possível e o Necessário. Outras áreas também começaram a usá-la, com destaque para Leitura e Escrita, na década de 1990.

A dupla conceitualização envolve duas etapas principais. Na primeira, o coordenador propõe uma atividade desafiadora para os professores. O objetivo é fazer com que eles vivenciem a situação de aprendizagem e identifiquem os conhecimentos que estão em jogo para ensinar determinado conteúdo. Se o tema da formação é o desenvolvimento da competência escritora, é possível propor ao grupo a produção de um texto e, durante o processo, fazer as intervenções necessárias usando os procedimentos envolvidos na construção textual, como o planejamento e a revisão. “Durante essa fase, o formador pode reconceitualizar os conteúdos, tornando observável o que os professores têm de ensinar. No caso da escrita, as intervenções devem mostrar que o conteúdo em jogo não é uma fórmula para ensinar e produzir os diferentes gêneros, mas a construção de competências leitoras e escritoras no aluno”, explica Paula Stella, coordenadora do Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária (Cedac), em São Paulo.

Na segunda etapa, o formador mostra como ensinar. Com base na atividade feita pelo grupo, ele promove uma discussão sobre as condições proporcionadas para realizá-la, a maneira como foi feito o planejamento, as intervenções do coordenador e o motivo de elas terem sido usadas – e levanta hipóteses sobre como ensinar determinado conteúdo. No fim, os professores devem ser capazes de planejar um plano de aula ou uma sequência didática para os alunos dentro da perspectiva estudada. “Apesar de serem mais difundidas na Matemática e na Leitura e Escrita, as situações de dupla conceitualização podem ser adaptadas à reflexão sobre o ensino de qualquer disciplina desde que sejam garantidas as duas etapas: a reconceitualização do conteúdo e o modo de ensiná-lo”, afirma Regina Scarpa, coordenadora pedagógica da Fundação Victor Civita.

Há alguns anos, Neurilene Ribeiro, formadora do Instituto Chapada de Educação, utiliza essa prática com sucesso durante os cursos de formação de professores e coordenadores pedagógicos que realiza em 30 municípios baianos: “Uso essa estratégia quando percebo que os professores desconhecem os conteúdos ou têm uma visão equivocada sobre eles”. Foi o que ela fez ao constatar que os professores do Ensino Fundamental tinham dificuldade em desenvolver procedimentos de estudo e, consequentemente, não sabiam como ensinar os alunos a estudar e a interpretar textos longos e complexos. Ela resolveu realizar uma situação de dupla conceitualização para que os docentes também aprendessem a fazer resumos, uma das maneiras mais eficientes de estudar (leia o depoimento de Neurilene abaixo).

Aprender e ensinar


Em um curso de formação, incluí uma situação de dupla conceitualização para que os professores aprendessem a resumir e, com isso, pudessem ensinar os alunos como estudar. Levantei as dúvidas e selecionei vários textos sobre como ensinar a ler para estudar, que serviram como referenciais teóricos sobre o objeto de ensino, ao mesmo tempo em que era preciso interpretá-los e resumi-los. Previ a organização do grupo em duplas, momentos de leitura e de tomada de notas, discussão sobre as abordagens de cada autor e a escrita de resumos, que seriam lidos pelos colegas. Na segunda etapa, analisamos os procedimentos usados e as intervenções feitas por mim que tinham ajudado na execução da atividade.

Eles conseguiram identificar algumas, e outras eu precisei explicitar. Com base no que tínhamos discutido, elaboramos uma sequência didática para ensinar os alunos a estudar.”

Neurilene Ribeiro, formadora do Instituto Chapada de Educação, de Salvador

Tematização da prática

“Tematizar significa retirar algo do cotidiano, fazer um recorte da realidade, para, então, transformá-lo em objeto de reflexão. É teorizar”, explica Telma Weisz, professora, pesquisadora e uma das pioneiras na introdução dessa estratégia no Brasil.

Antes de tematizar sobre a prática, é preciso capturá-la na forma de relatos e registros. Na primeira categoria, estão as escritas profissionais, como os relatórios e os diários de classe elaborados pelos professores. É importante ter clareza de que os relatos são sempre uma impressão da realidade, condicionada pelos saberes prévios de quem os produziu. Com base neles, é possível ter acesso às concepções dos professores. Já os registros são a documentação da prática que não passa pelo filtro ou pela interpretação de um relator. Aí estão as gravações feitas em vídeo ou áudio de uma aula e a observação em sala feita pelo coordenador pedagógico. Por não passarem por interpretação, eles permitem saber o que de fato ocorreu durante a interação entre aluno e professor. Por fim, essa ferramenta também pode ser usada tendo como base o planejamento de projetos didáticos e institucionais, sequências didáticas, planos de aula, rotina, portfólios dos alunos e até o projeto pedagógico – documentos que, ao serem elaborados em parceria entre professores e formadores, possibilitam a tematização em tempo real.

Para que ela aconteça de forma satisfatória, algumas condições básicas precisam existir. Devem ser usadas boas práticas como modelos para análise e discussão. Eles podem ser conseguidos dentro da própria escola ou trazidos de fora. Caso o professor que terá seus registros estudados seja da equipe, ele deverá aceitar os objetivos didáticos da tematização, estar consciente dos ganhos que terá no processo e concordar em socializar seus escritos com os colegas. Esse planejamento é fundamental para que a estratégia não se torne um julgamento da prática sem resultados formativos. “Não adianta registrar uma situação inadequada para dizer aos professores o que não funciona. É preciso ser afirmativo. O ideal são situações das quais seja possível extrair a teoria previamente estudada e os procedimentos aplicáveis a outras situações da mesma natureza”, ensina Regina Scarpa. É papel do coordenador trazer as referências teóricas necessárias para embasar a análise durante a formação.

Maria Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da Escola da Vila, em São Paulo, faz a formação continuada para os professores especialistas do segundo ciclo do Ensino Fundamental: “Como eles já dominam bem os conteúdos das respectivas áreas, é imprescindível que eu estude as didáticas específicas de cada disciplina para ajudá-los a melhorar a maneira de ensinar”.

Em uma atividade de Geometria para o 9º ano, Ivone usou os relatórios dos professores para fazer a tematização da prática. “Notei, durante os encontros de formação, que muitos tinham dificuldade em fazer intervenções quando a turma estava trabalhando com a resolução de problemas que exigiam dedução e muitos simplesmente nada faziam”, conta ela (leia mais no depoimento abaixo).

Registros reveladores


Usei os relatórios das aulas de Geometria para discutir com os professores como intervir quando os alunos estão trabalhando com processos dedutivos. Primeiro, montamos uma sequência didática que levasse as turmas do 9º ano a chegar a alguns conceitos. Nela estavam previstos os agrupamentos que seriam feitos e os conhecimentos que os alunos precisariam ter. Li muito sobre processos dedutivos antes de analisar os relatórios dos professores, que revelavam a atuação deles e os momentos em que tinham dificuldade de intervir. Verificamos que os alunos percebiam que os ângulos inscritos em uma semicircunferência eram retos, mas eles não sabiam explicar o porquê. Concluímos, então, que aqueles eram os momentos certos para a interferência: quando eles demonstrassem precisar
de mais informações para progredir.”

Maria Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da Escola da Vila, de São Paulo

De todos os tipos de registro, a gravação em vídeo é considerada a que tem o maior potencial formativo. “Ela permite que a prática seja analisada como ela realmente acontece, sem o viés interpretativo ao qual os relatórios estão sujeitos”, afirma Paula Stella, do Cedac. Helena Cristina Ruiz, coordenadora pedagógica da EMEI Professora Maria Alice Pasquarelli, em São José dos Campos, a 100 quilômetros de São Paulo, usa com frequência o vídeo para fazer a formação continuada das professoras de sua escola, que ocorre duas vezes por semana, em encontros de duas horas e meia. No começo do ano, ela planeja com toda a equipe a rotina para a creche e a pré-escola. Está prevista a realização de várias rodas de leitura, brincadeiras no parque e cantos de atividades diversificadas. “Por meio da observação da sala de aula, percebi que o que propusemos inicialmente não estava funcionando na maioria das salas. O problema estava na gestão do tempo e do espaço durante os ‘cantinhos’: algumas professoras ultrapassavam o tempo estipulado – fazendo com que a maioria das crianças ficasse cansada – ou tentavam ensinar conteúdos em um momento que deve ser de livre escolha”, relata Leninha, como é conhecida na escola. Os cantinhos são organizados com jogos, livros e brinquedos e têm como objetivo estimular a autonomia dos pequenos, que devem escolher onde querem ficar.

Depois de identificar onde estava o entrave, a coordenadora pedagógica foi atrás de um bom modelo. Encontrou-o dentro da própria equipe e decidiu que seria com ele que faria a tematização da prática. “Uma das professoras era muito organizada e criativa nas propostas, sabia como encaminhar as atividades e gerir a sala de uma maneira eficiente e concordou em compartilhar a experiência com as colegas. Juntas, fizemos um planejamento combinando que gravaríamos diferentes propostas, já prevendo as possíveis intervenções que seriam feitas. Gravei meia hora só com as atividades diversificadas que ela fazia com os pequenos”, conta Leninha (leia o depoimento dela abaixo).

Bons modelos


O vídeo foi importante para discutir com as professoras como trabalhar com os cantos temáticos. Gravei as intervenções de uma delas, que tinha um bom procedimento, para ser a base da discussão. Durante a exibição, refletimos sobre como foram feitas a organização da sala e a seleção dos materiais e a maneira de receber as crianças. Pudemos também analisar o papel das intervenções da professora. Discutimos as condições criadas para que os alunos encerrassem as atividades na hora prevista e guardassem os materiais – muitas professoras que estavam em formação tinham dificuldade nessa finalização. A observação do registro em vídeo foi útil para o grupo ter contato com um bom modelo de organização dos cantos. Outra grande lição foi que as educadoras precisavam controlar a ansiedade para não dirigir todas as situações, já que esse tipo de atividade tem como foco a autonomia das crianças.”

Helena Cristina Ruiz, coordenadora pedagógica da EMEI Professora Maria Alice Pasquarelli, de São José dos Campos (SP)

No fim: a aprendizagem

Os dois caminhos trilhados – a dupla conceitualização e a tematização da prática – se encontram no fim. Bem trilhados, levam à aprendizagem dos alunos. Ao reconhecer que os professores podem (e devem) construir continuadamante a reflexão sobre a prática e de que a base dos processos formativos são os conhecimentos didáticos que decorrem desse processo, o coordenador é capaz de fazer uso das estratégias de maneira a produzir uma escola dinâmica, independente e capaz de se adaptar constantemente às mudanças e exigências dos processos de ensino e aprendizagem.

Ser formador é oferecer a teoria e as condições para aprimorar a prática. É reunir opiniões e concepções da equipe em torno de um projeto pedagógico. É fazer com que os professores consigam ver além dos hábitos e conceitos adquiridos com a experiência e a formação inicial, por meio da sistematização do que ocorre em sala de aula. “Ao se tornar um formador, dominando as estratégias e o conhecimento didático, o coordenador assume sua responsabilidade e seu papel decisivo para a aprendizagem dos alunos”, finaliza Regina Scarpa.

Você tem tempo para tudo?

Você tem tempo para tudo?

Gestor que investe em planejamento evita ser escravo da burocracia e diminui os incêndios da rotina escolar
Daniela Almeida (gestao@atleitor.com.br)


Você consegue cumprir sua agenda ao mesmo tempo em que resolve os inúmeros imprevistos que aparecem diariamente? No dia-a-dia, você prefere cuidar pessoalmente da documentação da escola e, por isso, não encontra espaço para acompanhar a aprendizagem dos alunos? Ninguém tem dúvida de que o ideal seria ter tempo para tudo sem estresse nem sobressaltos. Mas como conseguir isso?

Administrar o tempo não é fácil, principalmente para quem ocupa uma função de liderança, em que é preciso dispensar atenção a vários assuntos ao mesmo tempo. "Planejar as tarefas é mais do que distribuí-las em horários. É ter clareza sobre sua real importância", afirma Débora Dias Gomes, pedagoga e formadora de profissionais da Educação em Gestão Estratégica, do Rio de Janeiro. Classificar as atividades, separando as que são fundamentais (e só você pode fazer) das que podem ser delegadas, é um caminho para ajudar a hierarquizar a agenda.

Existe um critério básico quando se trata de gestão escolar que pode facilitar a decisão: tudo o que está relacionado à aprendizagem dos alunos e ao planejamento pedagógico precisa de mais dedicação. As outras demandas geralmente podem ser delegadas a auxiliares (mas devem ser acompanhadas, é claro).

Exemplo: manter a papelada em dia é importante. Porém, se você se exceder na dedicação aos documentos, provavelmente sobrará pouco tempo para observar o movimento da escola e conversar com coordenadores, professores e alunos, aspectos que são mais relevantes para garantir um ensino de qualidade.

Outra dica: quanto mais tempo for investido em planejamento, prevenção, manutenção dos espaços e equipamentos e no projeto da escola, menos incêndios você terá para apagar diariamente. Afinal, canos de água estouram, mas podem estourar menos se houver a revisão periódica das instalações hidráulicas. Professores faltam, mas até isso pode ser previsto, e um plano B na gaveta ajuda a diminuir o fator surpresa.

Uma agenda ideal

Com isso, é fácil perceber a complexidade da gestão do tempo no cotidiano escolar. Por isso, pegue os resultados do teste realizado e analise:

• Se você passa a maior parte do dia fazendo as atividades ligadas ao projeto de escola, está no caminho certo e pode ser considerado um diretor focado na aprendizagem dos alunos. Afinal, as emergências podem ser minimizadas ou evitadas quando o projeto pedagógico é bem elaborado, o corpo docente discute o trabalho regular e coletivamente e os funcionários se sentem parte da equipe e atuam para que os alunos aprendam dentro e fora da sala de aula.

• As tarefas previamente agendadas, ligadas à rotina escolar, demandam igualmente um bom espaço na agenda (como as reuniões e a observação da escola), mas estão dentro do que já está planejado. Porém aí também estão as atividades burocráticas e a organização de festas e eventos, que precisam de acompanhamento, mas podem ser delegadas. Caso elas estejam consumindo mais da metade de sua jornada, cuidado para não se tornar um burocrata. Flexibilize e delegue mais.

• Com o planejamento bem feito e a rotina em andamento, certamente as urgências acontecerão com menos frequência. O sinal vermelho aparece se você começar a dedicar mais de 10% do tempo a coisas que deveriam ter sido planejadas. Nesse caso, cuidado! Pode estar prevalecendo o bombeiro no lugar do gestor!

• Finalmente, é preciso levar em consideração tudo o que não foi previsto, para repensar o projeto de escola (problemas de aprendizagem que indicam a necessidade de revisão do plano de formação de professores, materiais didáticos que não foram suficientes etc.). Então, se qualquer coisa der errado, pare, replaneje e elabore novos planos de ação.

O bombeiro

"Logo na entrada dos alunos, um pai me abordou, querendo conversar sobre as dificuldades que estava tendo em casa com os filhos. A conversa só acabou quando um dos professores apareceu desesperado porque o papel da impressora havia acabado na sala de informática. Ordenei a compra do material. Mas aí veio a cozinheira, dizendo que faltava um ingrediente para a merenda.

Fui até a cantina e montei um novo cardápio. Quando cheguei à minha sala para ver a agenda, um aluno se machucou na quadra. Levei-o ao posto de saúde e voltei no meio da tarde para assinar alguns papéis, mas um tumulto numa sala de aula me fez sair correndo.

O professor estava desesperado, porém logo bateu o sinal e todos foram embora."

Comentários

Ter flexibilidade é uma qualidade desejável em qualquer gestor, mas quem vive apagando incêndios na escola raramente se dedica a pensar na melhoria dos processos e no desenvolvimento das pessoas. Assim, a instituição fica lançada à própria sorte, pois ele apenas reage aos fatos, em vez de comandá-los. "Como está sempre correndo para diminuir o prejuízo, o diretor-bombeiro não consegue tomar decisões que resolvam definitivamente os problemas", diz o consultor pedagógico Carlos Luiz Gonçalves, de São Paulo. O resultado de tanta iniciativa e pouca conclusão dos processos é a eterna sensação de terminar o dia sem nada ter finalizado. Ou seja, frustração. Para escapar desse ciclo vicioso, é preciso antecipar as situações, observar as habilidades dos diversos membros da equipe, formá-los – afinal, são eles que vão ajudar na gestão – e delegar.

O burocrata
"Assim que cheguei à escola, pedi à secretária os formulários que precisavam ser preenchidos. Avisei o coordenador pedagógico que não iria à reunião bimestral para discutir a aprendizagem dos alunos, mas solicitei a ata do encontro para saber das decisões tomadas. Acho importante ter registro de tudo. No meio da manhã, chegou uma mãe querendo conversar, mas pedi para ela voltar no dia seguinte, com hora marcada. Saí para uma reunião na Secretaria de Educação. À tarde, fiz a revisão da documentação para a prestação de contas e o levantamento do material a ser comprado no próximo mês. No fim do dia, atendi um pai que trouxe a papelada do filho para a matrícula."

Comentários
A organização que falta ao bombeiro sobra ao burocrata. Esse gestor tem a tendência de focar a atuação na arrumação de documentos, na padronização das rotinas e na exigência excessiva de registros e regras – elementos que, equilibrados, são importantes no dia-a-dia escolar. O problema é que ele tem dificuldades em lidar com as situações que pedem jogo de cintura. "O burocrata tende a gostar mais de papéis do que de pessoas, por isso decide tudo sozinho. Se ouvisse a equipe, teria mais subsídios para tomar decisões", alerta Débora Dias Gomes. Praticar a gestão participativa, flexibilizar as regras, descentralizar os planos operacionais e deixá-los sob o comando de outros responsáveis, concentrando-se em análises institucionais e no planejamento estratégico da escola, são maneiras de não cair na armadilha da burocracia.

O focado

"Logo às 7 horas, eu estava no portão para receber os alunos e conversar com eles. Já na minha sala, revi a agenda e replanejei as tarefas pendentes. Conferi e assinei alguns documentos e fui para a reunião com os professores e a coordenação pedagógica. Uma funcionária me avisou que havia um problema de indisciplina, sugeriu um encaminhamento e decidimos como solucionar a questão. Depois do almoço, fui informado de que um professor havia faltado. Conversei com o coordenador e colocamos em prática o remanejamento que havíamos combinado para casos como esse. O imprevisto atrasou um pouco a reunião para revisão do projeto pedagógico, mas no fim deu tudo certo."

Comentários
Uma mistura balanceada entre a flexibilidade do bombeiro e a organização do burocrata. Assim é o gestor focado. Ele alia o dinamismo de um ao formalismo do outro, enxerga o contexto, organiza o tempo e o espaço, exerce a liderança participativa, acredita nas pessoas da equipe, cria sistemas de relacionamento com a comunidade, mantém comunicação com os pais, estrutura processos e garante o bom ambiente de trabalho. Ele consegue fazer tudo isso porque se ocupa da formação e do desenvolvimento da equipe, facilitando o aparecimento de outras lideranças. Para manter a boa gestão do tempo, elabora instrumentos que ajudam no automonitoramento, como planilhas, cronogramas e agendas. E tudo isso de olho no objetivo principal: assegurar o processo de ensino e aprendizagem.

Carlos Luiz Gonçalves, carlosluiz.consultor@hotmail.com
Débora Dias Gomes, ddg@esileducacional.com.br

terça-feira, 26 de maio de 2009

AVALIAÇÃO PARA QUE?

Segundo observações que são confirmadas por muitos autores, podemos responder à pergunta título desta postagem, apontando, que de modo geral serve: para classificar, castigar, definir o destino dos alunos de acordo com as normas escolares. Pode-se afirmar que a avaliação tem assumido, e já há muito tempo, uma função seletiva, uma função de exclusão daqueles que costumam ser rotulados “menos capazes, com problemas familiares, com problemas de aprendizagem, sem vontade de estudar, sem assistência familiar” e muitos outros termos parecidos.

Apartir de todo o conhecimento que possuímos sobre a avaliação, deixe seu comentário sobre essa situação abaixo:

O que significa em termos de avaliação um aluno ter obtido nota 5,0 ou média 5,0? E o aluno que tirou 4,0?

Como essa situação é tratada na sua escola?

quinta-feira, 21 de maio de 2009

ORGANIZAÇÃO É FUNDAMENTAL

Documentos em ordem

Ensine os professores a organizar os registros para depois usá-los em projetos de formação da equipe<
Amanda Polato (gestao@atleitor.com.br)

Os meses passam, as atividades feitas pelos alunos se acumulam e nem todo professor consegue organizar sozinho o material que a turma (ou ele mesmo) produz. Como esses registros são fundamentais para fazer a formação em serviço durante o ano, é função da coordenação pedagógica orientar a produção de portfólios, registros, pautas de observação, diários de aula e notas (e ajudar na montagem de tudo isso).

“Os arquivos com as escritas do professor ficam mais ricos quando resgatam os processos vividos em sala de aula”, avalia Fernanda Coelho Liberali, pesquisadora em Linguística da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e formadora de professores e coordenadores pedagógicos. Para que se tornem, efetivamente, recursos que ajudem a repensar a prática, os registros devem evitar descrições superficiais e burocráticas e portfólios apenas com as produções mais bonitas.

A ação da coordenação pedagógica é explicar como fazer uma reflexão crítica da atuação docente, descrevendo, analisando e questionando. Com os registros em mãos, é possível orientar o professor (leia um exemplo na ilustração) a montar pautas de formação centradas nas necessidades do professor para garantir mais aprendizagem para a turma. “Pastas, arquivos e portfólios podem ganhar vida quando trabalhados de forma crítica”, afirma Clézio dos Santos, professor de Geografia do Centro Universitário Fundação Santo André (FSA) e formador de professores em Santo André, na Grande São Paulo.


Portfólios para avaliação

Os professores podem fazer portfólio por aluno e por turma, contendo as atividades cotidianas ou de um projeto específico. As pastas podem ser arrumadas por área de conhecimento, conteúdos ou períodos. Esse instrumento de avaliação é comum na Educação Infantil, mas raramente é feito no Ensino Fundamental, apesar de ser o que melhor demonstra a trajetória de aprendizagem do estudante.

As pastas da turma toda, com as produções mais significativas, proporcionam uma visão ampla do que foi realizado em sala e devem ser guardadas pela escola para que os professores conheçam exatamente o que foi trabalhado no ano anterior pelo colega. “Só dessa maneira é possível dar continuidade ao processo de ensino e aprendizagem”, explica Débora Rana, coordenadora da Escola Projeto Vida e formadora do Instituto Avisa Lá, em São Paulo.
Os portfólios individuais precisam conter as atividades que mostrem os avanços de cada aluno (para antever o que precisa ser trabalhado na sequência). O segredo é recolher material durante todo o ano e não só num período específico. Como é muito difícil armazenar tudo, um bom critério é ficar com as produções que mostrem a evolução na aprendizagem e o avanço dos estudantes. Elisete Gomes da Silva Luttzolff, coordenadora pedagógica da EE Victor Civita, em Guarulhos, na Grande São Paulo, orienta os docentes a começar guardando a avaliação diagnóstica inicial: “Ela serve para afinar o planejamento de acordo com as necessidades da criança”.

Benigna Maria de Freitas Villas Boas, professora da Universidade de Brasília (UnB), recomenda que os professores incentivem os estudantes a conquistar autonomia a partir do 6º ano, deixando-os escolher as atividades que comporão a pasta, mas orientandoos a reconhecer o que é mais relevante.

Outro documento que pode constar do portfólio (ou ser usado separadamente) são os relatórios. Neles o professor comunica de maneira clara para a coordenação, os pais e os colegas o que o aluno aprendeu. Isabel Aparecida Pereira Amâncio coordena o núcleo de Educação Infantil da Escola Albert Sabin, em São Paulo. Lá, os portfólios são usados há três anos, mas só recentemente passaram a fazer parte da formação docente. Isabel discute com a equipe o andamento das turmas com base na produção das crianças e nas observações de sala. Avanços, dúvidas e problemas são registrados em pequenos papéis para orientar a pauta das reuniões pedagógicas. “Com base nas questões mais importantes, vou atrás de textos e materiais que nos ajudem a pensar em possíveis soluções e sirvam para trazer mais conhecimento ao grupo.”

Para não esquecer nada

Há três tipos de registro: notas, pautas de observação e diários de classe. As notas são anotações curtas feitas pelo professor durante a aula – perguntas e dúvidas levantadas pela garotada, conteúdos a pesquisar etc. São ótimas para lembrar o que colocar nos próximos planejamentos, nos relatórios e na avaliação.
Já as pautas de observação são tabelas com o nome dos alunos e uma lista de conteúdos, competências e habilidades a avaliar. Cabe ao coordenador ajudar o professor a preparar uma dessas para cada turma e a preenchê-la em periodicidade predefinida. Não basta um “x” em cada tópico. O ideal é acrescentar justificativas, observações e conclusões.

Os diários de aula são narrativas do que aconteceu em classe. O modelo deve seguir o dos diários pessoais, com reflexões sobre o planejamento e as necessidades dos alunos. Esse tipo de registro também é responsabilidade dos professores, mas não é fácil fazer. O maior problema é se acostumar a realizar descrições detalhadas, sem julgamentos de valor. Fernanda sugere que os coordenadores conversem com a equipe para que esses diários sejam feitos como se conta uma história: “Em vez de anotar apenas que os alunos ficaram envolvidos numa atividade, estimuleos a anotar os detalhes: se fizeram silêncio, formularam perguntas (e quais) e cumpriram todas as etapas da proposta, por exemplo”.

TIPO O QUE É PARA QUE SERVE COMO USAR

Portfólios Pasta com amostras do trabalho das crianças, como atividades, relatórios, desenhos, fotos, vídeos e registros sonoros. Avaliar continuamente a trajetória de cada aluno e de uma turma, dentro de um projeto específico ou ao longo do ano. Analisar os problemas de ensino que aparecem nas produções da turma e procurar maneiras de resolvê-los.
Registro de classe Notas, pautas de observação e diários de classe. Registrar e acompanhar diariamente as atividades de ensino e a evolução dos alunos. Refletir sobre a prática pedagógica com base nas dúvidas dos professores para ajustar práticas e encaminhamentos.
Planejamento Sequências didáticas, planos de aula, projetos didáticos e atividades permanentes. Organizar o planejamento anual e de aulas para formar a memória do trabalho realizado no ano. Antecipar os conteúdos que serão ensinados e a interação dos alunos com eles durante o planejamento. Serve também como banco de ideias de modalidades.


O papel de cada um

Ao ler os relatórios, é papel da coordenação pedagógica tecer comentários e sugerir aos professores como melhorar a prática. Em Jundiaí, a 60 quilômetros de São Paulo, a estratégia da coordenação da EMEB Professor Geraldo Pinto Duarte Paes é transformar as perguntas dos professores em situações problema para serem discutidas. Os momentos de reunião são registrados, e os novos conhecimentos, sistematizados. “O que fica só no discurso acaba se perdendo. O registro é importante para a formação e para a história da escola”, avalia Elizeth Cristina da Silva Ragazzo, uma das coordenadoras.

Já o diretor, como articulador do trabalho pedagógico, precisa dar todo o suporte necessário aos professores e à coordenação pedagógica. Um bom princípio é participar das reuniões (tanto de formação permanente como de acompanhamento) e ajudar na buscar das soluções para os dilemas de sala de aula. Para Clézio dos Santos, da FSA, ler os portfólios dos alunos e os registros dos docentes é uma forma eficiente de a direção acompanhar o aprendizado. “Sempre que for propor uma intervenção no cotidiano da escola ou em um curso específico, é preciso levar em consideração em que pé estão os trabalhos. Será que as crianças estão aprendendo?”, sugere o formador de professores.

COORDENADOR PEDAGÓGICO ....

É ele quem faz os craques brilharem

Com atuação voltada à aprendizagem e à formação dos educadores, o coordenador pedagógico afina o time de docentes da escolaFernando José de Almeida (novaescola@atleitor.com.br)

"A função primordial do coordenador
é procurar formas de ajudar os
professores de todas as disciplinas
a avançar."


Não sei se você gosta de futebol. Eu sou um grande fã e, por mais que a ideia pareça um pouco gasta, resolvi iniciar este texto cometendo a imprudência de comparar a escola com uma equipe do esporte. Começo pelos jogadores - alunos, professores, funcionários - e pela torcida - os pais, a comunidade, todos os dirigentes da Educação e a sociedade, muitas camisas incentivando para que o gol da aprendizagem aconteça.

Esse timaço não joga sozinho. Precisa de um presidente - no caso da escola, o diretor. Referência de reflexão e planejamento geral, é quem define as decisões mais gerais (o presidente negocia patrocínios, o diretor constrói o Projeto Político Pedagógico e estabelece parcerias), dialoga com a torcida (se o presidente recebe as organizadas, o diretor cuida da articulação com a comunidade) e zela pela agremiação (em seu "clube", o diretor faz a gestão administrativa, de aprendizagem, do espaço e da equipe).
Mas um time só com presidente seria meio capenga. Equipes de sucesso exigem um profissional que não apenas mergulhe na história do esporte, mas que esteja antenado com as principais novidades na área. Que domine a arte e a ciência do jogo não apenas para chamar a equipe à unidade, estimule-a quando toma um gol inesperado - "Exatamente quando estávamos jogando tão bem!" - ou a modere quando algum jogador se exalta. No futebol, essa pessoa é o técnico. Na escola, é o coordenador pedagógico.

Para ser bem exercida, a função de coordenador supõe um enorme conhecimento do conjunto da escola. Quem são os alunos? Quais turmas apresentam maior dificuldade (e em quais disciplinas)? Como trabalham os professores? Quais necessitam de maior auxílio na formação em serviço? O que os estudantes estão aprendendo - e o que estamos fazendo para ajudar aqueles que ainda não chegaram ao nível desejado?

Como se vê, o foco desse profissional aponta fortemente para a gestão da aprendizagem e para a formação dos professores. Isso inclui dominar algumas coisas que nenhuma faculdade ensinou a ele: saber como o currículo foi desenhado, quando e como se articulam as áreas do saber e quais os modelos de avaliação disponíveis. Apesar de não ser uma tarefa fácil, ela é indispensável. É justamente o conhecimento das diferentes disciplinas, de seus objetivos, de suas propostas de recuperação, da bibliografia adotada e das metodologias propostas que conferirá a ele a respeitabilidade dos professores. Isso exige muito estudo.

Vejo duas grandes perguntas a respeito da atuação do profissional. A primeira: o que, exatamente, ele tem de saber? Eu diria que a boa notícia é que ele não precisa entender de tudo. Sua função primordial é procurar formas de ajudar os professores de todas as disciplinas a avançar. A primeira edição da revista NOVA ESCOLA GESTÃO ESCOLAR traz um excelente exemplo de como esse auxílio acontece na vida real. A reportagem Documentos em Ordem mostra como a coordenação pedagógica pode orientar a equipe de professores na produção e montagem de portfólios, registros, pautas de observação, diários de aula e notas, registros fundamentais para o trabalho de qualquer docente.

A segunda pergunta: como (e onde) conseguir esses conhecimentos? Os caminhos são diversos: uma boa visita às livrarias da cidade, uma exploração atenciosa do acervo pedagógico na biblioteca do bairro, programas de formação oferecidos pelas Secretarias e outras instituições e a participação em seminários e congressos - com o compromisso evidente de socializar as informações principais para os demais profissionais da escola. Assim, o coordenador vai constituindo sua figura como um parceiro e um orientador do trabalho docente.

Para isso tudo, o coordenador tem meios de atuação difusos: a presença nas atividades pedagógicas que alunos e professores promovem, a conversa individual com os docentes e a direção, as apresentações de trabalhos, as organizações de estudos do meio, as visitas e as festas, o material que ele torna disponível na sala dos professores, os avisos que deixa no quadro e até mesmo a sala do cafezinho. Mas ele conta ainda com um momento privilegiado. É o chamado Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), período de formação em serviço durante o qual seu "jeitão" aparece e se consolida. Ali, o coordenador desenvolve seu máximo trabalho: fazer com que os professores, os verdadeiros craques do time escolar, brilhem (porque são as estrelas e, afinal, cabe a eles preparar as aulas, trabalhar duramente com centenas e centenas de alunos, corrigir provas e trabalhos, extenuar a voz para ser ouvido e ainda readequar suas aulas ao seu plano inicial).

No HTPC, o coordenador ilumina o trabalho dos docentes, colocando-os como o centro do processo de ensino e aprendizagem: o que cada um deles faz de melhor? O que precisa aprofundar, estudar mais, trocar com os colegas? É possível, por exemplo, levar para esse horário uma prova tão boa, concebida por um dos integrantes da equipe, que mereça ser estudada pelos colegas.

Atitudes assim põem em relevo a liderança do coordenador pedagógico. Não se trata, aqui, de liderança como imposição, mas como prestação de serviço, que junta as partes dispersas, evidencia as coisas boas, participa do dia-a-dia, avalia rumos, dá ideias com base nas necessidades, estimula práticas criativas de alunos e professores e apoia o diretor para cumprir sua tarefa de construir caminhos para a escola junto com a comunidade. Para retornar à metáfora futebolística, ele é um dos que mais ajudam a bola a correr bem redonda no gramado. Como o técnico, pode até não entrar em campo nem levantar o troféu, mas, sem ele, não existe time campeão.
Fernando José de Almeida
É filósofo, docente da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e vice-presidente da TV Cultura - Fundação Padre Anchieta.

GESTÃO PARTICIPATIVA

Administrar: uma ação coletiva

Diretor e coordenador pedagógico assumem novos papéis em uma gestão participativa
Paola Gentile (pagentile@abril.com.br)


Situação 1: no ano passado, o Colégio Estadual Niterói, em Volta Redonda (RJ), tinha uma verba sobrando. Os professores viram a possibilidade de começar as obras do tão sonhado laboratório de Ciências. Mas as merendeiras lembraram que a cozinha, sem janelas, precisava de mais espaço e ventilação. Os funcionários convenceram o corpo docente da urgência de sua reivindicação e o recurso foi aplicado na reforma da cozinha.

Situação 2: desde o ano passado, os professores do Colégio Estadual Carolina Lupion, de Carlópolis (PR), sentiram-se incomodados com a composição das notas dos alunos. Eles queriam somar às provas e aos trabalhos a participação em sala e as atitudes dos jovens em relação aos colegas. Direção e coordenação pedagógica propuseram que 60% da avaliação viesse do conteúdo ensinado, 20% da participação e 20% da postura pessoal. Sem consenso, a implantação da idéia foi adiada, pois as discussões continuam.

O que tem a ver a cozinha do Colégio Niterói com as notas dos alunos do Carolina Lupion? No centro das duas instituições está um modelo de administração baseado na participação de todos nas decisões dos rumos da escola. Afinal, se as diretoras tivessem mão-de-ferro e fossem autoritárias, teriam resolvido as questões sem ouvir seus pares.

Gestão da participação

Construir um ambiente democrático não é tarefa fácil e, por isso, não é empreitada para um só. "Uma gestão participativa também é a gestão da participação", afirma José Carlos Libâneo, professor da Universidade Católica de Goiás, em seu livro Organização e Gestão da Escola. Quem ocupa cargos de liderança — como diretor e coordenador pedagógico — precisa despir-se da postura de chefe para criar um clima em que todos dêem idéias, façam e recebam críticas e aceitem consensos.

"Administrar democraticamente pressupõe uma educação democrática, ou seja, saber ouvir, saber contestar com argumentos e ceder", explica Rubens Barbosa Camargo, professor do Departamento de Administração Escolar da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

De todas essas habilidades, ouvir talvez seja uma das mais difíceis. Afinal, as discussões, dependendo do tom dos interlocutores, podem virar bate-bocas. "Não se tem tradição em administrar confrontos", analisa Vera Maria Nigro de Souza Placco, professora do Programa de Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ela acredita que as divergências podem ser valorizadas quando há respeito e consciência de que a formação também se dá com a contribuição do outro.

Também é preciso garantir espaços e tempos para o debate. No cotidiano existem muitas oportunidades para isso, como nas reuniões pedagógicas, nos conselhos de classe, na Associação de Pais e Mestres e no conselho escolar (leia reportagem).

Diretores, seus adjuntos e os coordenadores pedagógicos, nesse contexto, participam no papel de articuladores e defensores da democracia interna. "Um diretor centralizador acaba tendo coordenadores idem, que não permitem a reflexão e a busca de soluções coletivas", alerta Luiza Christov, professora do Departamento de Educação do Instituto de Arte da Universidade Estadual Paulista. Essas figuras têm, portanto, de desempenhar papéis diferentes dos que costumavam ter em uma administração baseada na hierarquia (leia quadro abaixo).

Eleições e democracia

Algumas redes públicas prevêem a eleição para diretor e coordenador, ocasiões em que as chapas apresentam um projeto e assumem compromissos. Para Vitor Henrique Paro, professor da Faculdade de Educação da USP, seria um avanço para a gestão democrático-participativa se a lei acabasse com a hierarquia e previsse um núcleo diretivo para as escolas. Ele sugere que coordenadores de diversas áreas (pedagógica, administrativa, comunitária e financeira) assumam em conjunto as responsabilidades.

Mas, na prática, mesmo a lei não prevendo esse modelo, é possível garantir, no dia-a-dia, que os problemas sejam discutidos e decididos pela comunidade, se diretores e coordenadores pedagógicos investirem nas relações interpessoais e na garantia de espaços de discussão e de busca de soluções.
Os papéis de cada um
Diretores e coordenadores pedagógicos precisam propiciar um clima de abertura e respeito, para que todos possam criticar e sugerir sem medo de represálias. Veja o que cada um deve fazer, além de ouvir com atenção seus pares e administrar confrontos como momentos de crescimento, para que uma gestão seja democrática e participativa:

DIRETOR

Ser o articulador da proposta pedagógica

Decifrar e compartilhar as informações contidas em leis que afetam o cotidiano escolar

Propiciar momentos de discussão organizados, com pauta definida, com tempo e espaço para que todos participem

Definir problemas e identificar soluções, levando em consideração a opinião de todos

Coordenar a parte administrativa sem prejuízo do acompanhamento das questões pedagógicas

Ressaltar as funções educativas de todos os funcionários

Providenciar condições materiais e estruturais para que todos possam realizar seu trabalho

COORDENADOR PEDAGÓGICO

Participar ativamente da elaboração e discussão da proposta pedagógica

Estar atualizado com pesquisas e bibliografia para orientar os professores na busca de soluções

Garantir tempo e espaço — 2 ou 3 horas por semana — para discussão sobre a prática docente e relações com os alunos

Ser o organizador do processo de educação continuada da equipe

Ouvir as queixas dos docentes e criar uma rotina de reflexão coletiva sobre as possíveis soluções

Planejar e avaliar em conjunto as ações didáticas

Organizar estudos e leituras que possam levar o professor a ter autonomia sobre a sua docência

GESTÃO PARTICIPATIVA

Todos pela qualidade

A forma como a escola usa o espaço, as relações interpessoais e a interação com a comunidade também são importantes na Educação das crianças
Thais Gurgel (thais.gurgel@abril.com.br)
Escola limpa, bem conservada e equipada, com espaços adequados, equipe comprometida e comunidade atuante em seu cotidiano. Todos esses fatores são parte do que se entende por uma boa escola. O que nem sempre fica claro entre os integrantes da equipe, porém, é o objetivo primordial de buscar um ambiente como esse: oferecer condições para que as crianças, de fato, aprendam. Para que a gestão escolar seja bem-sucedida, cada medida tomada deve considerar esse preceito, funcionando como um verdadeiro filtro para todas as ações.

A maneira como diretor, professores e funcionários enxergam os alunos é outro ponto que pode determinar o funcionamento do ambiente. "É muito comum vermos equipes que parecem lidar com ‘alunos invisíveis’, condenados a usar banheiros sujos, comer com o prato na mão, de quem se pode falar mal em sua frente, como se não estivessem lá", afirma a consultora pedagógica do Centro de Documentação para a Ação Comunitária (Cedac), Maria Maura Barbosa. "O que existe é uma responsabilização do aluno (que é visto como quem depreda, é mal-educado) ou da comunidade (que é carente e violenta) pelas más condições da escola."

O gestor é o responsável pela criação de um ambiente acolhedor, que viabilize o trabalho educacional, cumprindo o projeto pedagógico da escola. Mas é essencial que ele envolva equipe, pais e alunos em torno desse objetivo. "Todos os atores da comunidade escolar ensinam e aprendem. E os espaços e práticas atitudinais também educam", diz Bianca Cristina Correa, especialista em gestão da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto.

Por isso, o diretor deve estar muito atento ao que se transmite "nas entrelinhas" dos processos e das relações interpessoais que se estabelecem na escola. Seu desafio é o de coordenar diferentes gestões - equipe, espaços, parcerias, recursos - para promover a aprendizagem das turmas. "As questões burocráticas e administrativas são apenas meios para concretizar as propostas pedagógicas", diz Vitor Henriques Paro, professor titular da Faculdade de Educação da USP.

Nessa abordagem, o olhar do gestor se volta fundamentalmente para três eixos: a organização dos espaços da escola (não só o das salas de aula), a mobilização de uma equipe coesa (que trabalhe para alcançar uma proposta pedagógica definida) e o estabelecimento de um canal de comunicação com pais de alunos e a comunidade do entorno. Embora ninguém afirme que isso seja tarefa fácil, aplicar essa teoria no dia-a-dia talvez não transforme a instituição numa escola dos sonhos, mas certamente trará resultados positivos sob todos os aspectos.

1. Novidade na área

Seja qual for o contexto em que se insira, a escola é, por definição, um local de aprendizagem. Mas o que ensina cada um de seus espaços? Salas de aula, locais de merenda, áreas de lazer, corredores e banheiros ajudam a construir e consolidar muitos valores. Se os alunos vêem que o banheiro está sempre sujo, se sentem menos estimulados a cuidar da higiene. "O diretor deve ver no respeito a locais públicos um valor a ser ensinado na prática e cuja importância deve ser trabalhada sempre", diz Maria Maura Barbosa.

O uso de todos os espaços da escola, ref letindo sobre sua forma de organização e buscando condições que promovam a aprendizagem (veja o infográfico clicando na imagem abaixo), tem de ser uma pauta constante da equipe escolar. "No contato com as Secretarias para a obtenção de recursos, o grupo que defende uma proposta de aprendizagem envolvida na melhoria de espaços dispõe de um argumento de peso", diz Roberta Panico, do Cedac. "E, se essa proposta for boa, pode ser estendida a outras instituições de ensino."
Pensando no comportamento dos alunos de sua escola durante as refeições, Iromar Medeiros de Souza, diretor da EM Bairro Industrial, em Barcarena, a 40 quilômetros de Belém, propôs uma reflexão à equipe de professores e funcionários. O que as crianças aprendiam com a forma como eram servidas as refeições?

Os professores identificaram alguns pontos críticos no processo. Como não havia mobiliário nem espaço definido, elas resolviam a questão como podiam: comiam em pé, brincando ou em qualquer canto. Para mudar esse quadro, o grupo elaborou o projeto Comer Bem Faz Bem. "Nossa proposta apresentava a seguinte pergunta: em que situações se prepara uma mesa com toalha limpa, louça e flores num vaso? Quando recebemos a visita de pessoas queridas e importantes", conta Iromar. "Quisemos mostrar que é exatamente isso que vivemos todos os dias aqui. Assim, criamos esse ambiente acolhedor em nossas refeições na escola para que as crianças se sintam bem recebidas e valorizadas."
Com recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), do Ministério da Educação, e outro tanto arrecadado numa festa junina, a escola ganhou um refeitório, numa área coberta, entre dois blocos de salas de aula. Os hábitos alimentares e o valor nutricional dos alimentos foram usados paralelamente como um tema, em classe.

Junto a isso, uma nova proposta foi apresentada: substituir pratos, canecos e colheres de plástico por copos e pratos de vidro e talheres de metal. "Existia o medo, por parte de alguns pais e membros da equipe, de que houvesse acidentes com os utensílios quebráveis e com garfos e facas", conta Iromar. "Como não tínhamos recursos para substituir tudo, precisávamos da colaboração das famílias e, para isso, da adesão delas à proposta."

O diretor enfatizou aos pais e à equipe escolar que o uso de peças de metal e vidro significaria um voto de confiança de que as crianças poderiam cuidar do material e que sua utilização contribuiria para que as refeições na escola se dessem da mesma forma que ocorrem fora. "A idéia não só foi aprovada como também hoje as famílias nos dão o retorno de que os pequenos continuam com a postura de respeito e cuidado nas refeições em casa", diz o diretor. "E mais: em um ano e meio, apenas um prato foi quebrado."

Também a área externa da Bairro Industrial ganhou um projeto educativo que envolveu a comunidade: a criação de um lago artificial. Um morador da região, que dava instruções sobre a manutenção da horta da escola, sugeriu a construção do lago com peixes, como o que havia feito em sua propriedade. A idéia foi levada adiante e virou a febre da garotada, que se orgulha do espaço. Após a implantação, diferentes projetos relacionados ao meio ambiente foram desenvolvidos em sala de aula.

Os corredores compõem um espaço de aprendizagem privilegiado, mas seu uso ainda é pouco ou mal explorado em muitas escolas. "A sua grande vocação é portar murais para a exposição de trabalhos, textos, recados, impressões e o que mais a comunidade achar interessante. São espaços públicos, que devem ser usados para compartilhar projetos", orienta Márcia Cristina da Silva, formadora de gestores do Instituto Avisa Lá. "As crianças se sentem valorizadas por verem seus trabalhos apreciados por colegas e há muita troca de experiências. O diretor deve ver nisso um valor."

Maristela Manilli Rossi, diretora da EMEI Emílio Carlos, em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, concorda com Márcia Cristina. "As paredes falam em nossa escola", orgulha-se. Nos corredores, os trabalhos são substituídos com regularidade e vêm sempre acompanhados de um texto dos professores sobre cada projeto. Assim, os pais podem acompanhar a produção dos filhos. E os pequenos participam ativamente da organização dos murais, escolhendo o que será exposto. "É muito estimulante ver como as crianças mostram o que fazem às outras e explicam sua técnica. Elas se sentem valorizadas e seus pais também."

2. Espírito de equipe

Há seis anos, Valdelice Barbosa Lima dirige a EMEF Deputado Ulisses Guimarães, que atende crianças do 2º ao 9º ano em Maracanaú, a 20 quilômetros de Fortaleza. Ela não tem dúvida sobre o segredo para a evolução dos índices de aprendizagem nesse período: "Atribuo tudo o que atingimos ao sentimento de colaboração entre a equipe, à vontade de trabalhar juntos", diz. Pela segunda vez, a instituição obteve o melhor resultado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em uma escola pública do Ceará - sem parcerias ou vinculação a outros órgãos que não a uma Secretaria Municipal. E quer melhorar ainda mais. Para isso, Valdelice aposta no apoio recebido da vice-diretora e da supervisora na interface com a equipe de professores e funcionários. A participação do "trio gestor" no planejamento, no acompanhamento e nas decisões sobre como encaminhar o projeto pedagógico em sala de aula, caso por caso, criou um ambiente de discussão focado na aprendizagem do aluno. Valdelice acompanha de perto o trabalho de sala de aula. O olhar não é de "fiscalização", mas de avaliação sobre as decisões tomadas coletivamente.

Para Bianca Correa, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, tal método pode ser um caminho interessante a ser seguido na gestão escolar. "O diretor precisa ter conhecimento pedagógico ou buscar parcerias para conseguir caminhar com os professores", reflete. "Só assim ele consegue dar sentido ao trabalho docente, fazendo cada educador se sentir parte de um grupo em que há espaço para tirar dúvidas e fazer sugestões de melhoria."

Muitas cabeças pensam melhor do que uma e idéias diferentes podem se complementar. Na escola, porém, essa lógica parece não funcionar com naturalidade. "A discordância é intrínseca à dinâmica de grupos, mas é preciso saber explicitar as divergências sem levar para o lado pessoal", diz Bianca. "O diretor é a figura que deve coordenar esse processo e propiciar a construção de consensos, que serão sempre provisórios. Toda decisão deve ser revista quando houver necessidade."

Criar um ambiente de discussões objetivas e focadas no interesse coletivo pode ser uma tarefa árdua. Na escola pública, o gestor tem de lidar com o que tem - em termos de recursos materiais, de espaço e de funcionários. Diferentemente das instituições privadas, ele não tem liberdade para substituições e ainda precisa lidar com a rotatividade de profissionais, o que gera descontinuidade no trabalho.

Cleuza Maria Sagrillo, diretora da EMEF Zilca Nunes Vieira Bermudes, em Aracruz, a 83 quilômetros de Vitória, acredita que o sentimento de grupo faz diferença: "O claro, para nós, é que o aluno é responsabilidade da escola e não de determinado professor. Assim, todo o corpo de servidores, docentes ou não, faz parte do processo educativo."

Semanalmente, a diretora e sua vice se reúnem com os diferentes grupos de funcionários para discutir, em termos pedagógicos, os encaminhamentos de suas respectivas áreas. Além dos encontros de planejamento pedagógico com os professores, há reuniões com as equipes administrativa, de limpeza e merenda e com os responsáveis pela biblioteca e a sala de vídeo. "Ainda promovemos atividades coletivas para a discussão de projetos, por exemplo", conta Cleuza.

A estratégia funciona tão bem que alguns funcionários passaram a atuar como voluntários em tarefas extras: uma bibliotecária conta histórias à comunidade, enquanto uma agente de limpeza ministra oficinas de pintura. "Elas se sentem, de fato, integrantes de um projeto comum, que é melhorar a qualidade da Educação das crianças e oferecer à comunidade a oportunidade de um acesso à cultura de forma mais ampla", diz Cleuza. "Isso significa um enorme ganho em seu envolvimento e seu trabalho."

3. Família bem-vinda

Quando a direção se aproxima das famílias, na busca de sucesso no processo educacional, os resultados aparecem. "Nossa escola era vista como um elemento estranho na comunidade. Sofríamos depredações, roubos, havia multirrepetentes e as famílias não tinham o menor compromisso com a Educação dos filhos", conta Marilene da Silva Santos Oliveira, diretora da EMEF Armando de Andrade, que atende 1.430 alunos, do 1º ao 5º ano, em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. "Hoje temos um espaço lindo, bem equipado, e nossa nota no Ideb já atingiu a meta prevista para 2010."

O caminho não foi fácil. Quando chegou à escola, em 2000, como assistente de direção, Marilene se deparou com problemas como falta de luz - provocada por cortes intencionais na fiação -, pichações e atos de vandalismo.

Em reunião na Associação de Pais e Mestres, surgiu uma idéia que revolucionou o relacionamento com a comunidade: já que as famílias dos alunos - a maioria de bairros pobres e de difícil acesso - não iam à escola, os professores iriam até elas. Foi elaborado, então, um cronograma de visitas. Os docentes passaram a ser vistos como aliados na Educação das crianças - alguém que compreende suas dificuldades e seu esforço. "Percebemos um fortalecimento incrível do compromisso dos pais e o número de faltas diminuiu drasticamente", lembra Marilene. A idéia acabou se estendendo às outras escolas da rede por meio do Programa de Interação Família-Escola, da Secretaria Municipal.

Outra iniciativa importante foi a oferta de cursos e a abertura de espaço para a prática de esportes. "A comunidade queria participar, se ver nesse local, que é público", diz a diretora. "Isso fortaleceu a gestão."

Sentindo-se acolhidas, as famílias passaram a participar de outras atividades ao lado dos filhos. "A escola deve reassumir a vocação de ser um centro cultural do bairro", diz Vitor Paro, da USP. "Ela forma cidadãos e, por isso, não se destina apenas à aquisição de conhecimento conteudista. A participação de uma diversidade de atores é, assim, fundamental."

Toda escola tem ao menos um canal institucionalizado de comunicação com as famílias: a reunião de pais. O modelo desses encontros, porém, pode mais afastá-los do que aproximá-los da instituição. "Eles devem ser chamados para compartilhar conquistas no desenvolvimento dos filhos e não apenas quando a escola necessita que eles façam alguma coisa", orienta Roberta Panico, do Cedac.

Alguns aspectos abordados nas reuniões fazem com que as famílias percebam a importância de garantir a freqüência dos filhos às aulas. Entre eles estão a apresentação dos assuntos que serão abordados a cada semestre, a forma como as crianças costumam aprender determinados conteúdos e as atividades previstas para serem realizadas no período.

Cada escola pode detectar o que serve melhor à comunidade e elaborar propostas de reunião. Existem, por exemplo, as que promovem dinâmicas de grupo, brincadeiras ou atividades entre familiares e alunos: tudo para estimular o envolvimento. O que não pode haver é a limitação das reuniões a questões como a indisciplina dos estudantes: acima de tudo, a reunião deve ter caráter pedagógico.

"Algo precisa ficar claro: é a escola que presta serviço à comunidade, não o contrário", defende Roberta Panico. "Por isso, a equipe escolar deve, sim, prestar contas e envolver os pais no trabalho que desenvolve. Todos saem ganhando com isso."

O CARÁTER FORMADOR DO ESPAÇO
A infra-estrutura é essencial no desenvolvimento dos estudantes. Confira algumas sugestões que você pode aplicar na sua unidade de ensino

CONSCIÊNCIA

Com a intervenção da equipe escolar, evita-se o desperdício. Os estudantes também podem colaborar para a limpeza do espaço.

AUTONOMIA

É uma conquista quando as próprias crianças se servem de comida. Assim, exercem o poder de escolha e exercitam o respeito à vez do próximo.

CIDADANIA
Fazer as refeições sentado, partilhando esse momento com os colegas, é um valor a ser ensinado e vivenciado na hora da merenda.

COMUNICAÇÃO

Os corredores são espaços por onde todos circulam e, por isso, perfeitos para propiciar trocas entre toda a comunidade escolar.

ORGANIZAÇÃO

Trabalhos dispostos na altura das crianças favorecem a apreciação da produção dos colegas. A distribuição nas paredes deve buscar a valorização.

HIGIENE

Para lavar as mãos depois de usar os sanitários e antes das refeições, é preciso ter sabonete (ou alternativas, como sabão e detergente).

LIMPEZA

Noções de higiene só podem ser ensinadas se for possível praticá-las. Vasos com tampa e papel higiênico são itens obrigatórios. Sempre.

AUTO-ESTIMA

O espelho é importante para trabalhar a identidade e a afirmação do aluno, propondo que ele preste atenção em si mesmo.

LIVRE EXPRESSÃO

O mural no banheiro é um espaço para se expressar de forma anônima e sem censura. Com ele, a depredação nas portas das cabines tende a sumir.

SEMPRE ATUALIZADO

Liderar para o aprendizado

Manter diretores sempre atualizados ajuda (e muito!) na qualidade da Educação
Ana Rita Martins (ana.martins@abril.com.br)


Originalmente, o relatório da McKinsey possuía apenas três lições. A quarta, sobre gestão, nasceu da constatação prática de que, depois da qualidade do professor, a liderança escolar é a segunda característica que mais influencia a aprendizagem. "A idéia de que toda escola precisa de um grande gestor já estava presente quando falamos da formação dos professores. Mais tarde, decidimos enfatizar esse ponto em uma lição específica porque, sempre que se inicia uma reforma, é preciso assegurar que as pessoas certas estejam no lugar certo. Garantir isso é função da liderança escolar", afirma Mona Mourshed, coordenadora do estudo.

Sistemas de alto desempenho têm sucesso na gestão escolar pela aplicação de três medidas: atrair as melhores pessoas para a tarefa, incentivá-las a desenvolver habilidades de liderança e fazer com que elas dediquem a maior parte de seu tempo à formação permanente de professores e funcionários, em vez de se ocupar só com tarefas burocráticas. Cingapura é um país que consegue conjugar essas práticas. O acesso à carreira de salários altos só se efetiva depois de uma pesada formação de seis meses no Instituto Nacional de Educação. No dia-a-dia, a formação segue na forma de tutoria: cada diretor pode eleger outros dois para obter aconselhamento sobre sua atuação (leia no quadro abaixo).

Em Cingapura
Pré-requisitos: graduação, atuação destacada e curso específico
Indicação: avaliação do Ministério da Educação

Os escolhidos

Diretores são selecionados em rigoroso curso de seis meses
Primeiro, eles precisam provar que foram ótimos alunos na faculdade. Depois, necessitam construir uma trajetória destacada nas escolas em que atuam - se quiserem ser diretores, esse é um dos itens que mais conta. Finalmente, têm de sobreviver a um curso de formação do Ministério da Educação focado em Administração e Liderança. "Há muita prática nesse programa. Uma de minhas missões era seguir os passos de uma diretora e implantar um projeto inovador na escola dela", conta Wei-Li Liew, diretora da escola Xinmin, em Cingapura. No fim, um seletivo exame elimina os menos preparados. Acabou? Não. Desde 2007, o Ministério da Educação convida profissionais iniciantes a participar de um programa de mentoria. Wei-Li escolheu dois colegas mais experientes para aconselhá-la - entre eles, a diretora que teve de acompanhar, especialista em planejamento estratégico e currículo. "Ao longo do ano, há pelo menos seis sessões formais com os mentores. Nesses encontros, posso discutir a liderança e debater os problemas práticos que enfrento na escola." Nos próximos anos, ela pretende seguir uma das opções que o governo oferece: mestrados, especializações ou programas de interação com os pares.

A situação brasileira é uma cópia em negativo do parágrafo anterior. Para atuar como diretor de escola, o profissional precisa ser formado em Pedagogia - ou ainda ser graduado em outras áreas e ter licenciatura em Educação. É muito pouco em termos de gestão. "O educador sai da faculdade sabendo apenas o básico e precisa de uma preparação posterior que amplie seus horizontes e crie a possibilidade de ele se tornar um profissional melhor", afirma Bernadete Gatti, diretora de Pesquisas da Fundação Carlos Chagas, em entrevista ao Especial Gestão Escolar de NOVA ESCOLA. Por essa razão, é comum que o gestor encontre dificuldades para as quais a faculdade não o preparou (saiba mais no quadro abaixo).

No BrasilPré-requisito: graduação em Pedagogia
Indicação: nomeação, eleição ou concurso

Por conta própria

Gestores precisam pagar pela formação específica
Embora existam opções de formação continuada financiadas pela União, pelos estados e pelos municípios, muitos educadores são obrigados a usar as próprias economias para bancar a capacitação. "Eu me tornei diretora há três anos. Aprendi na prática e com as leituras extras que fiz. Para enfrentar melhor o desafio, paguei por conta própria um curso de especialização em gestão escolar. Não foi fácil: gastei 5 mil reais em um ano de curso, fora o dinheiro da passagem e da alimentação, pois ele era na capital do estado", conta Micele Albano de Moraes, diretora da EE Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, em Monte Negro, a 250 quilômetros de Porto Velho. A necessidade de complementar a graduação em Pedagogia nasceu da fragilidade da formação. "É a realidade da maioria das faculdades: algumas preparam para a liderança, mas a maioria não", afirma Bernadete Gatti, da Fundação Carlos Chagas. Para driblar a enorme distância entre teoria e cotidiano escolar, Micele se aconselha com os integrantes mais experientes de sua equipe. "A vice-diretora, Marlene, trabalha há 25 anos com Educação e me ajuda nessas horas. Sinto que compartilhamos um compromisso pelo aprendizado. Isso me motiva a seguir adiante."


POR ONDE COMEÇAR

Para enfrentar as deficiências da formação inicial, é quase inevitável que os gestores precisem recorrer à formação continuada. Os dois maiores cursos apostam na capacitação a distância. Apoiado em parcerias com Secretarias Estaduais e Municipais, o Ministério da Educação mantém o programa Escola de Gestores, iniciativa de qualificação que inclui cursos de extensão, atualização e pós-graduação, com uma carga horária que varia entre 100 e 400 horas. Já o Conselho Nacional dos Secretários da Educação (Consed) organiza o Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares, o Progestão, que já treinou cerca de 100 mil gestores em mais de 20 estados. Três quartos do total de 270 horas/aula são ministrados a distância.

Se a escolha forem os cursos presenciais de especialização ou mestrado em gestão escolar, a recomendação principal é ficar atento ao currículo, que deve ter como foco a aprendizagem e o que ocorre nas salas de aula. Uma terceira alternativa, mais abrangente, são cursos que envolvem todo o município na melhoria escolar. "Nesse caso, consultores acompanham a implantação de novas práticas e orientam as mudanças junto a todos os agentes do processo educativo. O diretor é elemento central nessa transformação", afirma Tereza Perez, diretora-executiva do Cedac.

GRAU DE DIFICULDADE

Médio. Há medidas simples e de fácil comprovação prática. Muitos programas de formação continuada começam pela gestão do espaço escolar, prática que contempla a atuação em equipe, as relações interpessoais e a interação com a comunidade. O impacto na aprendizagem é mais difícil de ser observado, pois há outras variáveis envolvidas na melhoria do desempenho dos alunos - ele está mais relacionado, por exemplo, ao papel do coordenador pedagógico.

CUSTOS

Variáveis. O Escola de Gestores, do MEC, não tem custo para o município. O secretário entra em contato com a Undime e indica os profissionais que gostaria de capacitar. Nos cursos de especialização e mestrado em gestão escolar, a opção por universidades públicas representa uma redução sensível (ou total) nos custos. E no Programa Escola Que Vale, do Cedac, a estimativa é de uma mensalidade de 22 reais por beneficiário.

TEMPO ESTIMADO

A gestão do espaço escolar costuma ter resultados imediatos. Cuidados com a limpeza, a distribuição da merenda e a conservação da escola podem ser a mola propulsora de uma mudança profunda. Quando bem conduzida, a ênfase no trabalho em equipe também aparece no curto prazo. O impacto na aprendizagem é mais demorado. Resultados palpáveis são sentidos a médio e longo prazos - ainda assim, embalados em um conjunto de políticas.

FORMAÇÃO DE GESTORES

Tempo de unir esforços

É preciso haver a definição de uma estratégia para a formação de gestores escolares, de modo que eles não necessitem seguir aprendendo na prática profissional o que os cursos falham em ensinarGilda Cardoso de Araújo (novaescola@atleitor.com.br)

As iniciativas de formação inicial e continuada de gestores no país apresentam dois grandes problemas: a dissociação entre teoria e prática e a desarticulação de políticas promovidas por distintas agências e instâncias de governo.
Observam-se processos de formação muito distantes das novas e complexas demandas para a gestão escolar, como garantia do direito à Educação nas escolas (acesso, permanência e qualidade), articulação e manutenção dos mecanismos de gestão democrática (conselhos, associação de pais, grêmios), autonomia pedagógica e financeira (incluindo habilidade para captação e gestão dos recursos descentralizados), coordenação do processo de elaboração, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico, e construção de clima e cultura organizacional favoráveis aos processos de ensino e de aprendizagem para o exercício pleno da cidadania.
Além disso, são vários os programas, os cursos e as capacitações que, na maioria das vezes, são pontuais (palestras, seminários, fóruns etc.), descontinuados e desarticulados com os preceitos e princípios do Sistema Nacional de Ensino, presentes na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Os indicadores educacionais demonstram que a melhoria da qualidade das escolas está relacionada a variados fatores, entre os quais, a gestão é aspecto relevante. Os resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), por exemplo, trazem indícios de que as instituições que contam com um diretor que tem qualificação específica, mecanismos estáveis de integração com a comunidade e estratégias para diminuir o abandono e a repetência num projeto pedagógico elaborado e realizado coletivamente apresentam alunos com melhor desempenho nos testes.

Essas e outras evidências apontam para a necessidade da formulação e implantação de políticas de formação que sejam articuladas e voltadas para práticas mais adequadas de gestão escolar. Uma forma de impedir o avanço de iniciativas que vemos hoje no país: pontuais, excessivamente conceituais, livrescas, sem relação com o "chão da escola" e que pouco incidem na transformação que se quer para a Educação brasileira.

O Ministério da Educação vem empreendendo esforços no sentido de superar as dificuldades de formação inicial e continuada. Uma das iniciativas é a indução da articulação entre universidades e governos estaduais e municipais mediante o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, que promove cursos de aperfeiçoamento e especialização, partindo de reflexões teóricas consistentes que auxiliam o gestor a implantar medidas que garantam o direito à Educação, a democratização e a qualidade do ensino.

O Brasil não pode esperar que os diretores escolares aprendam "na marra", por tentativa e erro, como atuar política e tecnicamente em sua função. Nesse sentido, a responsabilidade e o compromisso das diferentes instâncias do poder público com a formação de gestores - preferencialmente gratuita, consistente e articulada - são imprescindíveis para a melhoria da qualidade da Educação Básica.

Gilda Cardoso de Araújo é professora e coordenadora do curso de especialização em Gestão Escolar da Universidade Federal do Espírito Santo

FORMAÇÃO PROFISSIONAL -

Gestão Escolar

É tudo na prática

Como existe um abismo entre os conhecimentos que as faculdades oferecem e a realidade do cotidiano escolar, os diretores acabam aprendendo na marra os meandros da função.

Para atuar como diretor de escola, o profissional precisa ser formado em Pedagogia. Mas há uma concessão para os graduados em outras áreas, com licenciatura em Educação. Todos estão, teoricamente, aptos a gerir uma escola. Porém, na prática, o que se revela é uma distância abissal entre o cotidiano escolar e os conteúdos adquiridos no curso superior. Nem todos os diretores têm experiência mínima em docência, o que costuma ser um pré-requisito até mesmo no caso das indicações políticas. Inexperientes e cheios de atribuições e responsabilidades, eles acabam sentindo na pele as implicações e complicações do cargo. Segundo o Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), o país tem quase 200.000 diretores de instituições de Ensino Básico. Desses, 82,6% atuam na rede pública. No total, 86% têm curso superior, enquanto 85% possuem experiência de pelo menos dez anos em Educação. E, muitas vezes, uma década de prática docente não é suficiente para suprir as lacunas de conhecimento que quase todo diretor de primeira viagem tem.

"Ninguém nasce sabendo administrar", afirma a diretora do Departamento de Pesquisas da Fundação Carlos Chagas, Bernardete Gatti. Por isso, na opinião dela, a formação continuada é uma ferramenta essencial para o preparo e a atualização dos gestores escolares. "Alguns cursos de Pedagogia preparam para a liderança, mas a maioria não", diz ela. "O educador sai da faculdade sabendo apenas o básico e precisa de uma preparação posterior que amplie seus horizontes e crie a possibilidade de ele se tornar um profissional melhor."

Com a crença de que a escola que conta com bons diretores tende a obter bons resultados, educadores, pedagogos e teóricos da Educação vêm se agrupando, em diferentes locais e instâncias, com o objetivo de preparar e manter cursos capazes de ampliar o repertório e os conhecimentos sobre gestão dos atuais diretores de instituições públicas. Nesse sentido, despontam no país iniciativas consistentes tanto no âmbito público como no privado.

Capacitação a distância

Em 2004, o então ministro da Educação, Tarso Genro, encomendou um trabalho ao Inep sobre a pertinência de criar um programa de formação dirigida ao gestor. A iniciativa resultou no projeto experimental Escola de Gestores, do Ministério da Educação (MEC), que segundo Lia Scholze, uma de suas idealizadoras, foi uma experiência ao mesmo tempo nova e inusitada. "O MEC nunca havia feito nada parecido. O projeto piloto envolveu diretores na elaboração do currículo e utilizou a tecnologia nos módulos a distância", conta.

Conforme a educadora, o planejamento do programa incluía ações de curto, médio e longo prazos a serem tomadas em cada escola. Ao fim do curso, os resultados foram apresentados on-line. "Diretores que nem sequer sabiam entrar na internet aprenderam a usar a tecnologia a favor da gestão, estabelecendo uma rede de comunicação em municípios espalhados pelo Brasil", destaca.

A presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (Consed) e secretária do Tocantins, Maria Auxiliadora Rezende, atenta para o fato de que o diretor hoje é chamado a lidar com muitas variáveis: "A escola é gestora de recursos públicos, recursos humanos, indicadores, licenciamentos... Não dá para ser gestor tendo sido apenas um bom professor", reflete.

Segundo Maria Auxiliadora, que também dirige o Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares (Progestão), existem conhecimentos específicos que devem ser contemplados, tornando o profissional de Educação apto, de fato, a gerir uma escola. "São saberes como liderança, capacidade de lidar com a diversidade, com o coletivo, ter metas e diretrizes, mesclar a dimensão pedagógica e a dimensão administrativa da gestão sem se transformar num burocrata e focar todas as ações para que a aprendizagem aconteça dentro da escola."

O Progestão já formou mais de 100 mil gestores, em mais de 20 estados. Três quartos das 270 horas/aula são ministradas a distância. São nove módulos, baseados em preceitos como a gestão democrática da escola pública, a participação da comunidade na elaboração do projeto pedagógico, a oferta de conteúdos comuns entre os diferentes municípios (para assegurar unidade e padrão de qualidade, respeitando as especificidades de cada escola) e a utilização das competências empíricas dos gestores.

Características básicas

Para Bernardete Gatti, existem três características imprescindíveis para o bom diretor, independentemente de ele passar por uma formação continuada ou não. A primeira, quase elementar, é a noção do sistema escolar. "É fundamental, para estabelecer as ligações necessárias com os professores, inserir a escola na comunidade, conhecer a rede, o município, a região e as exigências próprias do sistema", diz. Outros traços essenciais para obter sucesso no cargo dizem respeito à capacidade de relacionamento com públicos estratégicos numa instituição de ensino. "O gestor deve ter espírito de equipe para articular as diferentes partes da escola e distribuir funções", ressalta Bernardete. "Por último, é fundamental a capacidade de se relacionar com a comunidade do entorno."

A formação de uma equipe colaborativa, a construção de conhecimento sobre gestão e a articulação com a comunidade formam o tripé que baliza o projeto Comunidade de Gestores do Programa Escola que Vale, parceria entre a Fundação Vale do Rio Doce e o Centro de Documentação para Ação Comunitária (Cedac). Totalmente presencial e com o propósito de formar não só diretores mas também formadores, o programa ganhou amplitude justamente graças a uma dificuldade encontrada inicialmente.

O Escola que Vale se voltava exclusivamente para professores, mas, sem o envolvimento dos gestores, era muito difícil promover melhorias efetivas nas escolas. "Começamos a trabalhar com os diretores quando nos demos conta de que o trabalho só com os professores não era suficiente", explica a diretora do Cedac, Tereza Perez. "As mudanças que os docentes queriam fazer nas escolas dependiam do envolvimento de supervisores, de diretores e das Secretarias de Educação. Os professores eram tolhidos, boicotados. A escola não acolhia as novas ações, não atendia ao que estava sendo proposto."

Assim, lembra Tereza, nasceu a proposta de um programa mais amplo. "Como a equipe que desenvolvia o trabalho não tinha repertório em gestão, surgiu a idéia de capacitar formadores. Os próprios diretores seriam as pessoas mais indicadas para replicar o trabalho com os colegas de sua rede."

Por meio dos formadores, as ações planejadas por um só diretor são refletidas em todo o município. A cada encontro, a coordenadora regional do programa, Maria Maura Barbosa, faz o seguinte cálculo: soma o número de formadores presentes na sala, multiplica pelo número de escolas que cada um deles representa e multiplica de novo pelo número de alunos de cada escola. O resultado é invariavelmente volumoso: de 50 a 70 mil alunos são afetados pelas ações planejadas nos encontros.

Desde 2005, a Comunidade de Gestores do Escola que Vale realizou 324 horas/aula, em 36 encontros presenciais, que resultaram em melhorias físicas consideráveis nas escolas, bem como no atendimento aos alunos. Os resultados são vivenciados em cada realidade escolar. As mudanças mais impactantes mostram resultados quase imediatos. As ações de longo prazo se revelam aos poucos.

Para os especialistas, quando a engrenagem funciona bem, a escola não depende tanto do diretor para alcançar bons resultados. Assim, uma vez concluído o mandato dele, o impacto da troca de comando não deve ser grande. Aliás, mudança é uma palavra que deve fazer parte do dia-a-dia de uma instituição de ensino. Afinal, estar aberto às transformações impostas pelo mundo exterior é uma condição fundamental para o sucesso. "Por mais que as questões básicas estejam asseguradas, sempre haverá novas demandas", diz Tereza Perez. Para ela, a formação de gestores é um trabalho sem fim: "A escola sempre pode melhorar".
O processo de escolha
Existe mais de um caminho para a sala da diretoria. Quando o assunto é a melhor maneira de escolher o gestor, falta consenso e sobra polêmica. Há os defensores da eleição direta, os que acreditam que os concursos garantem a seleção dos mais bem preparados e ainda os que apóiam a indicação política para o cargo.

O acesso ao cargo (em %)
Fonte: Secretaria de Educação Básica/2003

Fernando Almeida, ex-secretário municipal da Educação de São Paulo, é categórico: o método é o fator de menor importância na discussão. "O diretor precisa ter clareza de que o projeto pedagógico de uma escola não é uma invenção, mas uma peça essencial, colocada no meio de um plano municipal de Educação, que por sua vez está no interior de um plano estadual e de um plano nacional", argumenta. "Na existência de uma política educacional sólida - e políticas são idéias de longo prazo -, se o diretor foi eleito, concursado ou nomeado, não faz muita diferença."

Já Luiz Fernando Dourado, da Universidade Federal de Goiás, embora concorde que a democratização da Educação seja um processo muito mais abrangente que o método de escolha do diretor, é um defensor da eleição direta. "Não se democratiza a escola por um só mecanismo. A eleição direta, bem como a existência do conselho e do grêmio escolares, faz parte desse processo de democratização", comenta Dourado.

Concursada, Lisete Arelaro, uma experiente diretora de escola pública em São Paulo, defende a eleição. "No concurso, se escolhe a escola por conveniência e não por concordar com seu caráter pedagógico". Lisete sugere que o professor seja o cargo-base do educador, podendo ser diretor durante um tempo e retornando mais tarde às funções docentes. O que, admite, não é possível devido à diferença salarial: "Ganha-se muito mais sendo diretor do que professor, por isso, muitos bons professores se tornam gestores. Não é por vocação, mas por remuneração".

Almeida diz que todas as formas de escolha têm prós e contras. "A eleição representa a vontade da maioria, mas nem sempre o eleito é o mais competente. Às vezes, ele é só o mais simpático."

GUIA JURIDICO DO DIRETOR

Gestão Escolar
Guia jurídico do diretor escolar
As leis e normas que os diretores têm a responsabilidade de conhecer, aplicar e garantir que sejam cumpridasLuiza Andrade (novaescola@atleitor.com.br)

Quando o assunto são normas educacionais, os desafios dos diretores começam desde o primeiro instante em que entram na escola. Ao assumir o cargo, já é preciso conhecer os estatutos estaduais e municipais, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o Plano Nacional de Educação, o Plano de Desenvolvimento da Educação, o Estatuto da Criança e do Adolescente e alguns capítulos da Constituição Federal. A tarefa não é simples e, ao ler cada artigo e parágrafo, há que se ter em mente que a finalidade de todos é uma só: garantir que os alunos aprendam.

Para atingir esse objetivo e estar sempre dentro da lei, o bom gestor deve, segundo Maria do Pilar Lacerda, secretária da Educação Básica do Ministério da Educação, seguir cinco princípios fundamentais: "Quem age com transparência, publicidade, moralidade, impessoalidade e economicidade age com ética". Com um exemplo simples, a compra de papel para a escola, dá para entender o que ela quer dizer. Toda a comunidade deve saber da aquisição do material (transparência) e, para isso, o diretor precisa avisar todos (publicidade). Não se pode comprar de um parente (impessoalidade, moralidade) e deve-se procurar sempre a melhor relação custo/benefício (economicidade).

"A garantia do ensino é um processo que envolve toda a instituição. À frente dele está o gestor, que precisa se questionar continuamente sobre a maneira como lê as normas municipais, estaduais e federais e sobre o que ele próprio está fazendo para que as condições de aprendizagem sejam cumpridas", diz Maria Maura Gomes Barbosa, coordenadora pedagógica do Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária (Cedac) e formadora de professores e diretores.

Vale recordar que nenhum cidadão, seja ele gestor público ou não, pode descumprir a lei sob a alegação de que não a conhece. "O desconhecimento não diminui a culpa. Por isso, os diretores só podem agir em segurança se estiverem informados a respeito da legislação", esclarece Maria do Pilar. Além de pesquisar os documentos oficiais, ela sugere que os gestores procurem as secretarias de Educação locais para saber se oferecem serviço de assessoria jurídica. Outro facilitador é o investimento na gestão democrática, pois, quando o colegiado ou o conselho escolar funcionam, o diretor compartilha responsabilidades e não toma decisões importantes sozinho - tudo é votado, aprovado e documentado.

Conheça a seguir algumas das principais normas que regem o ensino no Brasil e acompanhe o comentário de especialistas.

VERBAS

LEI DE DIRETRIZES E BASES
Título VIII - Dos recursos financeiros

Os destinos possíveis para os recursos da Educação estão listados no artigo 70. Alguns deles são: aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino; uso e manutenção de bens e serviços vinculados ao ensino; aquisição de material didático; e manutenção de programas de transporte escolar. Em seguida, no artigo 71, vêm despesas que não podem ser pagas com esses recursos, como programas suplementares de alimentação, assistência médicoodontológica, farmacêutica e psicológica, e outras formas de assistência social.

"Nesses artigos", explica Maria do Pilar, "há o que se pode ou não fazer com o dinheiro da Educação. Fica claro que não se pode gastar com saúde, comprando óculos para as crianças, por exemplo." Com esses dados, é necessário sempre avaliar as prioridades e pensar naquilo que efetivamente melhora as condições de aprendizagem.

O artigo 2 da resolução que dispõe sobre o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) também lista os destinos possíveis para a verba oriunda desse programa, como manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade; implementação de projeto pedagógico; e funcionamento da escola nos fins de semana.

CARREIRA

PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO
Capítulo I - Artigo 2º

"A participação da União no Compromisso será pautada pela realização direta, quando couber, ou, nos demais casos, pelo incentivo e apoio à implementação, por municípios, Distrito Federal, estados e respectivos sistemas de ensino, das seguintes diretrizes: XIII - implantar plano de carreira, cargos e salários para os profissionais da Educação."

O plano de carreira é elaborado pelas redes municipais e estaduais. "É dever do diretor legitimar o projeto da secretaria e fazer com que ele seja cumprido em sua escola", diz Maria Maura. É seguindo o estatuto de sua região que o gestor deve avaliar contratações, vagas em concursos, planejamento coletivo e formação continuada. Também é preciso cuidado em relação às faltas dos profissionais que trabalham na escola. "Acontece de um professor faltar e o diretor se questionar se deve cortar o ponto ou não. Às vezes, ele conhece a história do professor, sabe que tem um parente doente e resolve não cortar. Mas se não o conhecesse? Seria, então, válido dar falta? E, ao encobri-la, o gestor está ajudando na educação das crianças? É preciso pensar sobre isso", diz Maria do Pilar. A secretária de Educação Básica do MEC orienta o diretor a não esquecer, diante de dilemas como esse, que é um gestor público - assim como prefeitos, governadores e administradores - e deve agir com o compromisso ético

JORNADA

LEI DE DIRETRIZES E BASES
Título V - Capítulo II
Seção I: Das disposições gerais

"Artigo 24. A Educação Básica, nos níveis Fundamental e Médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: I - a carga horária mínima anual será de 800 horas, distribuídas por um mínimo de 200 dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver."

A escola é um espaço de direito, ou seja, um lugar onde há diversas pessoas exercendo seus direitos - em especial, as crianças e os adolescentes. É nisso que se deve pensar ao fazer o calendário anual. "Suponhamos que a escola abra no sábado para um evento e que esse dia seja contado como dia letivo. A criança que não pode comparecer sai prejudicada. O diretor deve indagar-se: 'Isso está correto?', 'Isso contribui para a aprendizagem?' , ou seja, ele deve prestar atenção e, se preciso, fazer uma revisão da maneira como interpreta a leitura das normas de seu estado e município referentes à jornada de trabalho, visando sempre a garantia do ensino", diz Maria Maura.

QUALIDADE

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Capítulo III - Seção I Da Educação

O artigo 206 lista uma série de princípios a seguir, como igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; e garantia de padrão de qualidade (também previstos pela Lei de Diretrizes e Bases).

Esses itens estão presentes no projeto Qualidade da Educação - Garantia Constitucional, desenvolvido em 2007 pelos advogados Aloysio Meirelles de Miranda Filho e Ana Carolina Pellegrini Monteiro por encomenda da Fundação Lemann. "Há cerca de três anos, começamos uma pesquisa para checar como estão as leis federais que dizem respeito à Educação. Constatamos que o acesso está bom. O que falta é a qualidade. É preciso dar atenção aos princípios básicos da Constituição, que deixa claro que a qualidade é a prioridade", explica Ana Carolina.
Quer saber mais?

INTERNET

Constituição federal
Informações sobre o PDE, a LDB e o PNE
Estatuto da Criança e do Adolescente
Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária

A LEGISLAÇÃO A SEU DISPOR.

Gestão Escolar
DiretorLegislação


Todas as leis da Educação


Constituição Federal de 1988


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

Lei 8069 / 1990


Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)

Lei 4024 / 1961

Lei 5692 / 1971

Lei 9394 / 1996


Fundef


Emenda Constitucional 14 / 1996

Lei 9424 /1996


Fundeb

Emenda Constitucional 53 / 2006

Lei 11494 / 2007


Plano Nacional de Educação

Lei 10172 / 2001


Piso Salarial

Lei 11738 / 2008


Fonte oficial de legislação brasileira

O MUNDO VIRTUAL A DISPOSIÇÃO DO GESTOR

Ajuda real no mundo virtual
Confira algumas páginas na rede que podem dar uma força na hora de usar as tecnologias na sua escola
Gustavo Heidrich (gustavo.oliveira@abril.com.br)

Ponto de Encontro
Parceria da Microsoft e da Fundação Victor Civita, conta com cerca de 400 comunidades virtuais sobre diversos temas de Educação.

Portal Educarede
Mantido pela Fundação Telefônica, traz artigos, planos de aula, vídeos, podcasts e animações sobre o uso da tecnologia na escola, além de oferecer ferramentas de bate-papo e criação de comunidades virtuais.

Blog Professor Digital
Diário virtual com orientações e reflexões sobre o uso da tecnologia mantido pelo professor José Carlos Antônio da EE Professora Neuza Maria Nazatto de Carvalho, em Santa Bárbara do Oeste, em São Paulo. Confira o texto “Quebrando computadores” no qual o professor fala sobre os laboratórios de Informática fechados.

Banco Internacional de Objetos Educacionais
Página colaborativa mantida pelo Ministério da Educação que disponibiliza conteúdos digitais em áudio, vídeo, texto, além de imagens, animações e softwares de acesso livre para uso nas escolas.

Proinfo
Programa do Ministério da Educação criado para dar suporte pedagógico e de infra-estrutura para uso das tecnologias nas escolas de ensino fundamental e médio.

Escola do Futuro
Núcleo de estudos de Tecnologia da Educação da Universidade de São Paulo (USP). Disponibiliza artigos, teses e projetos de aplicação da tecnologia nas escolas.

Portal do Professor
Criado pelo Ministério da Educação, reúne áudios, vídeos, mapas, animações, experimentos, cursos de formação, comunidades virtuais, blogs, chats, fóruns e outros recursos para professores.

QUANDO O DIRETOR SE TORNA UM GESTOR

Gestão Escolar

Quando o diretor se torna um gestor .

A verdadeira missão do líder da escola é conciliar as demandas burocráticas e pedagógicas - para garantir que os alunos progridam
Julia Priolli (novaescola@atleitor.com.br)
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Em que medida as condições sociais definem a escola? Até que ponto a escola pode transformar as condições sociais? As duas perguntas, que trazem perspectivas de ações diversas, costumam vir à tona quando se reflete sobre o papel da Educação na sociedade. E dar conta desse compromisso - ou, ao menos, tentar - sempre foi o grande desafio das escolas, embora, muitas vezes, as mazelas sociais funcionem como uma justificativa quando professores e diretores falham em suas tarefas.
VISÃO CRÍTICA As famílias e a comunidade demandam da escola soluções para problemas sociais. Cabe ao gestor criar as condições para que a realidade seja trabalhada de forma crítica em sala de aula

Na prática, quem responde diretamente por essa cobrança no dia-a-dia é o diretor escolar. "Existe uma grande expectativa de transformação social por meio da transformação pessoal que a Educação proporciona", diz Nora Rut Krawczyk, professora de Sociologia da Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "Essa é a promessa da escola como instituição." Hoje, na avaliação de secretarias municipais e estaduais, institutos de formação, universidades e do próprio Ministério da Educação, o diretor é a figura central para promover esse ganho de qualidade de que a Educação brasileira tanto necessita. E, da mesma forma que seu papel é importante, sua rotina está cada vez mais complexa. Ele deve, cotidianamente, dar conta de diferentes "gestões": do espaço, dos recursos financeiros, de questões legais, da interação com a comunidade do entorno e com a Secretaria de Educação e das relações interpessoais (com funcionários, professores, famílias). Tudo isso, com um objetivo maior, que, se não é novo, ganhou uma importância que parecia um pouco esquecida nos últimos tempos: a aprendizagem dos alunos.
Sim, a expectativa em relação à função vem mudando muito nas últimas décadas. Um dos momentos mais importantes dessa transformação ocorreu em meados dos anos 1980, quando a idéia de que o modelo de gestão dos sistemas públicos estava ultrapassado virou um consenso entre os educadores. A solução foi aproximar os serviços governamentais dos princípios da gestão empresarial, nos quais a busca pela eficiência é o maior valor. Desde então, de certa forma, a gestão escolar vem se adaptando para incorporar essa lógica à realidade das salas de aula. "O que se quer é formar vida inteligente dentro do organismo escolar", afirma Fernando Almeida, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e ex-secretário da Educação da capital paulista. Por tudo isso, prossegue Almeida, o diretor, ou melhor, o gestor deve ter uma visão global da instituição e, ao mesmo tempo, focada nos alunos. "É ele quem cuida de todas as partes desse organismo vivo", justifica.
Do lado de dentro
Imagine uma escola em que o gestor seja visto como um chefe autoritário, pelo qual todos sentem mais temor do que respeito. Agora vislumbre um cenário apenas de cobrança de resultados e exigência do cumprimento de regras, sem a participação nas decisões conceituais e corriqueiras do dia-a-dia. E se esse mesmo diretor só se ocupar das questões burocráticas do cargo, deixando de lado tudo o que se refere às relações humanas, exceto o trato com alunos indisciplinados, encaminhados à sua sala como uma forma de punição? Talvez nem seja preciso ter tanta imaginação, já que muito dessa postura antiquada e praticamente alheia ao cotidiano educacional - na mais precisa acepção da palavra - ainda está bastante presente em algumas escolas brasileiras.
VALORIZAÇÃO HUMANA A postura do diretor imprime marca às relações interpessoais no ambiente escolar. Professores, funcionários, pais e alunos ao mesmo tempo ensinam e têm coisas a aprender
Embora um tanto extremo, o exemplo serve para mostrar que a forma como o gestor se posiciona na escola exerce grande influência sobre como se dão as relações interpessoais. O entendimento de alunos, pais, funcionários, professores e, sobretudo, dos próprios diretores sobre seus papéis na dinâmica escolar é decisivo para determinar a qualidade da instituição. E mais: se todos não enxergam que sua função deve, acima de tudo, colaborar para um processo educativo exitoso, é hora de procurar reverter esse quadro. "É preciso ressignificar o papel do diretor na escola e o da escola na comunidade", afirma Roberta Panico, coordenadora pedagógica da formação de gestores do Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária. "A equipe tem de perceber que o gestor é o articulador de demandas e soluções para a aprendizagem das crianças. E que é essa a função social primordial de toda escola."
Para a autora portuguesa Isabel Alarcão, não apenas os alunos, mas toda a comunidade deve se desenvolver no convívio escolar. Esse é um dos aspectos do conceito de "escolas reflexivas", criado por ela. "Elas qualificam não só os que nela estudam mas também os que nela ensinam ou apóiam estes ou aqueles", afirma a autora, em sua obra Escola Ref lexiva e Nova Racionalidade. "Ela gera conhecimento sobre si própria e, desse modo, contribui para o conhecimento sobre essa instituição chamada escola."
DE OLHO NO ENTORNO A escola se insere num bairro e sua equipe deve conhecer a realidade local. Só assim é possível conhecer as necessidades das pessoas e adequar-se a elas
Embora o grande foco do gestor deva ser a aprendizagem dos alunos, de forma alguma isso diminui a importância do coordenador pedagógico. A parceria entre os dois é uma das mais relevantes na construção de uma escola de qualidade. Para isso, eles precisam estar sempre muito afinados. A principal função do coordenador é cuidar da formação dos professores, um dos aspectos decisivos para implementar o projeto pedagógico decidido coletivamente pela comunidade escolar (processo que, como um todo, é de responsabilidade do gestor).
Do lado de fora
Nas últimas décadas, as demandas sociais em relação à escola têm aumentado substancialmente. O fenômeno se deve, principalmente, ao crescimento da violência urbana - muitas vezes, associada ao consumo e ao tráfico de drogas -, à falta de perspectivas profissionais e ao aumento da competitividade e do individualismo provocados pela globalização da economia.
Cada vez mais, exige-se que a escola colabore para transformar esse cenário, perceptível do lado de fora de seus muros, tematizando-o em suas atividades diárias com o objetivo de melhorar o futuro dos estudantes. "Desenvolver uma visão crítica da realidade, trazendo-a para a sala de aula como uma reflexão propositiva, é algo essencial", diz Nora Rut, da Unicamp. "A instituição de ensino não é um local para esquecer a dura realidade, como alguns colegas acreditam."
FOCO EDUCATIVO Lidar com a burocracia não pode ocupar todo o tempo do diretor. Além de conhecer leis e normas e saber gerir recursos, o foco principal deve ser a aprendizagem de crianças e adolescentesAssim, a equipe de professores precisa se organizar para promover discussões sobre temas locais e globais. Além disso, a postura da equipe e as situações vivenciadas na escola servem como base para abordar temas como cidadania, tolerância e respeito. "É o gestor quem imprime uma cara à instituição, quem retoma os projetos institucionais, que são permanentes e abrangem a escola como um todo", diz Márcia Cristina da Silva, formadora do Instituto Avisa Lá, de São Paulo. "É ele quem lembra a todos o que o grupo quer ser e que alunos pretende formar."
Na teoria, tudo faz sentido. Mas o dia-a-dia da maioria é muito mais ocupado com a solução de emergências do que com o planejamento pedagógico. "Que diretor costuma ter muita dificuldade em dizer o que faz parte de sua rotina de trabalho, pois passa o dia resolvendo problemas. Mas nem tudo na escola é urgente. Ele pode determinar uma divisão de tempo, reservando um horário fixo para atender pais, para reuniões com o coordenador etc.", propõe Márcia Cristina. Vitor Henriques Paro, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, resume: "O diretor tem de ter visão pedagógica em todas as suas ações. As atividades burocráticas são antiadministrativas quando não estão relacionadas com o pedagógico. A finalidade de todo o trabalho é garantir que a relação entre ensino e aprendizagem se concretize". Quando isso ocorre, o diretor se transforma, efetivamente, num gestor.

Séculos de história

As revoluções Francesa e Industrial deram cara nova ao Velho Mundo, inclusive no que se refere ao acesso à Educação. No final do século 18, passou para o Estado a incumbência de educar os cidadãos, o que levou à grande ampliação do número de colégios na Europa nos dois séculos seguintes. "A escola substituiu a Igreja na formação dos jovens", afirma o educador português Rui Canário. "Por isso, tem um papel fundamental na consolidação das nações modernas".
No Brasil, os jesuítas foram os principais responsáveis pelos primeiros passos da nossa Educação. Em 1759, os religiosos foram expulsos do país, deixando um legado de 17 colégios e "escolas de primeiras letras". Com um decreto do imperador Pedro II, em 1822, instituiu-se um modelo de ensino conhecido mais tarde como "aulas avulsas", em que um adulto se responsabilizava por crianças de diferentes idades e percursos. Essas "escolas" funcionavam na casa do próprio professor. Na época, os funcionários das poucas instituições de ensino não tinham formação pedagógica, já que a primeira Escola Normal brasileira só surgiu em 1835. "Os diretores eram, em geral, pessoas generosas, conhecidas por suas benemerências e, por isso, designadas para o cargo", explica Lisete Arelaro, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
A primeira iniciativa visando a criação de uma rede de escolas se deu apenas durante o Estado Novo (1937-1945). O ensino formal, então, era pautado pelas Leis Orgânicas de Educação, que se aproximavam dos ideais fascistas, caros à ditadura de Getúlio Vargas. Nessa época, a proposta era qualificar a mão-de-obra nacional, acompanhando o ritmo de crescimento da indústria mundial e das novas profissões que nasciam.
Com a Lei de Diretrizes e Bases de 1971, a Educação no Brasil foi estruturada em sistemas municipais, estaduais e federal. Durante a ditadura militar (1964-1985), cada diretor tinha também o dever de enquadrar o projeto educacional de sua escola ao ideal de potência nacional a que o país aspirava. Com a redemocratização, na década de 1980, o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, que congregava entidades sindicais, acadêmicas e da sociedade civil, foi uma das instituições mais atuantes para a inclusão, na Constituição federal, da determinação de que a escola brasileira tivesse como preceito a gestão democrática - vigente até hoje.